Toda a natureza, a vida e o mundo inteiro que circundam o artista, e a vida de sua alma, são a fonte única de cada arte, É muito perigoso suprimir uma parte dessa fonte (vida exterior em torno do artista) ou outra (sua vida interior), mais perigoso mesmo que cortar uma perna de um homem, porque essa pode ser substituida por outra perna artificial. Aqui, corta-se mais que a perna. Corta-se a vida à sua própria criação. O pintor 'nutre-se' de impressões exteriores (vida exterior) e a transforma em sua alma (vida interior), a realidade e o sonho! Sem o saber. O resultado é uma obra.
(...) Na arte abstrata a análise serve para adiquirir o conhecimento do 'ofício', enquanto a força criadora tem por base a síntese. (...) O pintor abstrato não recebe sua 'impulsão' de um pedaço qualquer de natureza, mas de natureza inteira, em seus aspectos mais diversos, que nele vêm adicionar-se para levá-lo a criar uma obra. Essa síntese procura a forma de expressão que melhor lhe convém, isto é, a forma não figurativa. A forma abstrata é mais ampla, mais livre que a forma figurativa; seu conteúdo é mais rico.
Mas, infelizmente, o materialismo nos acostumou demais a confundir o aspecto exterior das coisas com sua realidade interior, e por isso mesmo a não sentir o conteúdo por trás da forma.
Assim, a arte abstrata é uma arte atual, viva, que escapou à classificação, à etiquetagem - ainda bem!
Wassily Kandinsky
Fonte: Do Espiritual na Arte