27/07/2010

Mandalas

           Mandala, em sânscrito, significa círculo. Jung associava as mandalas ao self, o centro da personalidade como um todo. No âmbito dos costumes religiosos ou da psicologia, designa imagens circulares que são desenhadas, pintadas, configuradas plasticamente ou dançadas. Não existem registros de sua origem, todavia, os motivos circulares são encontrados desde a antiguidade, nos desenhos das cavernas pré-históricas ou, ainda que simplificados, nas rosáceas das antigas catedrais, bem assim na natureza e no corpo humano.

         Quando desenho mandalas, as imagens não precedem de nenhuma sugestão. Elas surgem espontaneamente, originadas de uma fonte inconsciente. Essas imagens são uma ponte entre o inconsciente e a consciência, ou seja, é uma forma que o inconsciente encontra de se comunicar com a consciência, através de uma linguagem simbólica. A respeito do tema, Jung diz que “a união dos opostos num nível mais alto de consciência, não é uma questão racional e muito menos uma questão de vontade, mas um processo de desenvolvimento psíquico, que se exprime em símbolos”.

            A existência depende de nosso histórico de vida: quando ampliamos essa consciência, integrando esse inconsciente que nos é inerente, ultrapassamos nossa historicidade, dando à nossa vida maior significado e compreensão dessa complexidade que somos.

            Todos nós precisamos de um momento, um dia, ou uma hora reservada para, simplesmente, vivenciar e trazer à tona o que realmente somos. Hoje, nossas vidas se orientam pela praticidade e pelo consumo, a ponto de nos envolvermos tanto com essa “roda viva”, e nos esquecermos daquilo que são nossas intenções genuínas. Precisamos encontrar os caminhos que nos levam a esse espaço sagrado, seja por meio da música, da dança, dos desenhos ou de qualquer coisa que realmente gostamos de fazer. Podemos pensar, em um primeiro momento, que nada acontece; mas se nos permitirmos gozar desse espaço sagrado e nos servirmos dele para que possamos entrar em contato com nosso eu, ouvir o corpo, perceber as emoções, com certeza estaremos nos reservando a oportunidade de irmos ao encontro das lembranças que nos aproximam daquilo que nos é essencial.

Ana Maria Pereira de Freitas 
 

19/07/2010

Sunshine - O Despertar de um Século

Sunshine - O Despertar de um Século


Este drama épico conta a história de várias gerações de uma mesma família de judeus na Hungria. De origem humilde, os Sonnenschein chegam a ter dinheiro e influência no início do século 20. O patriarca se torna um juiz de respeito, mas sua carreira é afetada quando medidas anti-semitas são tomadas pelo governo. Seu filho se converte ao cristianismo para escapar às perseguições, mas mesmo assim se torna uma vítima do nazismo. O neto sobrevive à guerra e toma suas origens como o que tem de mais importante. Ralph Fiennes interpreta três homens de diferentes gerações da família.


Meu olhar através do filme parte do viés da psicologia. Depois de assistir o filme Sunshine mergulhei numa reflexão a qual partilho com vocês. No filme vemos uma família de judeus nas suas diversas gerações tentando se enquadrar ao "status quor" do momento em que estão vivendo, percebemos como essa adaptação (assimilação - como é usado no filme)  levam essas pessoas a questionarem seus destinos e muitas vezes a pagarem um alto preço, até mesmo com a vida, de formas trágicas,  o que geralmente acontece. 
              Minha reflexão parte de um questionamento: O que mudou no comportamento do homem no decorrer dos séculos? Percebo que o que mudou são apenas as roupagens, o contexto histórico, a tecnologia, a política, os ideais, mas de forma mais profunda carregamos o mesmo paradigma, estamos ainda tentando nos "adaptar" a uma cultura consumista, onde o "ter" é o que nos referencia diante de uma sociedade exclusivista, ainda tentamos nos moldar para conquistarmos o reconhecimento social e pessoal. No filme foi preciso viver várias gerações para se resgatar a origem e reconquistar o significado de estar vivo, fazendo uma analogia,  vejo que hoje essa sociedade que nos abriga também nos afasta de nossa verdadeirta essência, na tentativa de nos adaptarmos vamos distanciando do que temos de melhor em nós, vamos perdendo nossa verdadeira identidade e consequentemente nos distanciamos do sentido de nosso viver. Cada ser vivente tem o seu dom a cumprir, nos colocarmos como vítimas desse sistema só nos faz cada vez mais "ajustados", mas jamais realizados como pessoas e felizes. Passamos uma vida inteira buscando a felicidade nas coisas que nos cercam, e esquecemos de olhar onde ela realmente reside que é dentro de nós, nas nossas ações verdadeiras, na nossa liberdade de expressão, naquilo que somos em essência e que o mundo insiste em nos roubar. 
          O filme nos convida à reflexão, é carregado de pequenas colocações, que atentos, se pode questionar, tras um leque grande de possibilidades, é profundo, e pode nos levar a infinitas interpretações. Compartilho um pouco do que refleti a respeito, poderia me estender porque há muitos argumentos para discussão, mas me detive apenas num aspecto psicológico. O espaço está aberto aos comentários, inclusive áqueles que assistiram e o viram com outro olhar. Para aqueles que não assistiram, recomendo.
 Ana Maria

01/07/2010

CONSCIÊNCIA CORPORAL

“O corpo é um processo vivo, organizacional, que sente e reflete sobre sua própria continuidade e forma” (Stanley Keleman)

“Não é à consciência que o sujeito está condenado, mas ao corpo.” (J. Lacan)


Vivemos uma vida inteira aprendendo “coisas”, tudo nos é ensinado, como comer, como limpar, como fazer, como nos comportar, mas geralmente não aprendemos o corpo, a cuidar do corpo, a exercitar as necessidades do corpo, a escutar o corpo, a sentir o corpo. Aprendemos os cuidados com higiene mas nada num sentido mais profundo que vai além da higiene pessoal.

          É fundamental ao nosso equilíbrio que tenhamos uma consciência corporal mais abrangente. Aprender a ouvir e nos orientar através dos nossos sentidos, eles são nossas antenas, o que nos conecta ao mundo. O corpo não é um entrave, como muitos pensam, mas sim uma ferramenta poderosa que temos ao nosso alcance, é o que nos possibilita fazer a ligação entre matéria e espírito.

           O mundo moderno com sua tecnologia, e a poderosa cultura de consumo, nos fragmenta, nos materializa ao invés de humanizar. Não condeno a evolução industrial, só entendo que isso ao contrário de nos ajudar está nos destruindo, não porque seja ruim, mas porque não estamos sabendo usar a “máquina”, não podemos esquecer nossa humanidade, precisamos aprender a integrar o que separamos. O corpo exerce exatamente essa função, a de integrar. É através do corpo que existimos, é o corpo que nos abre à possibilidade do mistério, aquilo que não apreendemos mas sabemos que é, podemos viver uma vida inteira negando esse aspecto em nós, mas a única certeza que temos em nossa vida é que um dia vamos morrer. Não aprendemos a respeitar o processo de envelhecimento do corpo, que assim como a natureza, tem seu ciclo, e por mais que tentemos interferir nesse processo mais nos distanciamos da essência divina dentro de nós.

             O corpo, assim como a natureza, pede cuidados, é nossa casa, pede também atenção e respeito. Se aprendermos a ouvir o corpo, saberemos como estar no mundo. Mas para isso é necessário apreender cada parte do nosso corpo, a valorizar cada membro, cada órgão, cada músculo, cada forma, sem distinção, porque toda parte tem sua importância, cada uma exerce uma função fundamental ao seu bom funcionamento Aprendendo a relacionar com nosso corpo, ouvindo suas necessidades, aceitando e respeitando seus limites, percebendo suas funções e seu simbolismo, estaremos nos abrindo a uma nova consciência, mais ampla, mais significativa, para que então possamos integrar com o mundo e com o outro.


Ana Maria P. de Freitas

Imagem: http://sharkassimetrico.blogspot.com/2007/02/corpo.html
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