Ontem participei da festa de São Batuque, que pelo que entendi da proposta São Batuque é aquele que convida aos batuqueiros ou a quem quiser e sentir vontade a tocar seus tambores. Vários grupos se apresentaram e por trás dessa expressão senti o grito dos negros na sua luta pela liberdade, mas a liberdade de existir. E ai está o meu ponto de reflexão, que liberdade é essa que todos buscam? Porque acredito que não são os negros, que ainda se sentem excluídos, buscam, mas todos aqueles que se excluíram de si mesmos. O homem está "fora de si", numa busca incessante por um lugar ao sol, mas que lugar é esse?
Nos vejo hoje cercados por uma parafernália carregada de pragmatismos e uma corrida desvairada pela idéia de consumo, encarcerados aos condicionamentos que nos privam totalmente da possibilidade de Ser. Que liberdade é essa, que todos estão buscando? Liberdade que negros, brancos, homossexuais, indios, mulheres, crianças, viciados, ricos e pobres, enfim, acredito, nós seres viventes, porque o tempo todo estamos a ouvir os gritos e expressões por todo o planeta em busca de algo... o que afinal?
Não seremos os homens perdidos de nós mesmos? Não será essa busca angustiante pelo poder a razão de estarmos totalmente perdidos, sem direção? Quem já chegou lá, não encontrou, quem está a caminho, não consegue encontrar, e quem ainda não começou não tem a menor idéia por onde começar. E enquanto nessa busca desesperada vamos atropelando o que vemos pela frente, o outro passou a ser o entrave do caminho, as informações chegam e são resultado de uma sociedade esquizofrênica, totalmente dissociada. Afinal o que resta disso tudo são pessoas fragmentadas, acolhidas por uma sociedade doente, e o que se consegue extrair disso tudo é de uma superficialidade assustadora. Estamos criando nossas próprias guerras, que começam nos nossos ambientes de sobrevivência, nas distancias da indiferença, nas pequenas mentiras, os gestos esquecidos pela falta de tempo, nas competições pessoais, que alimentados vão ganhando as proporções sociais, afinal, sociedade somos nós, ou VOCÊ se excluiu da sua?
Será que não estamos desejando nos incluir de onde nós mesmos nos excluimos? Não será esse o paradoxo? A ausência de nós mesmos, por termos esquecidos da dualidade que somos, não somos só matéria, mas somos trambém espíritos. Não será na compreensão do humano em nós, da integração de nossas dualidades e na apreensão do mistério que nos envolve que o homem poderá se libertar? Que poderá encontrar dentro de si mesmo a liberdade e a paz tão procurada?
"Viver ultrapassa qualquer entendimento", dizia Clarice Lispector, e confiar nesse mistério, acredito, venha a ser o grande desafio do Ser nesse mundo pragmático que criamos para nós mesmos, ou seja, dar um passo para trás, respirar profundo, e dar-se conta de que o que precisa mudar é cada um dentro de si mesmo, modificando os hábitos, desaprendendo para aprender de novo, buscando um olhar mais inocente, para então uma nova sociedade surgir, não perfeita, mas humana.
Ana Maria
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